Retro Review | A Semente do Diabo (Prophecy, 1979)

John Frankenheimer nos conduz em uma jornada angustiante na escuridão interior em 'A Semente do Diabo', com Robert Foxworth e Talia Shire


Robert Foxworth, Talia Shire e Victoria Racimo como Rob, Maggie e Ramona no filme 'A Semente do Diabo', de John Frankenheimer
Robert Foxworth, Talia Shire e Victoria Racimo como Rob, Maggie e Ramona no filme 'A Semente do Diabo', de John Frankenheimer


Entre as décadas de 1950 e 1960, habitantes da cidade de Minamata, localizada ao sul da Província de Kumamoto, no Japão, apresentaram sintomas de uma doença que se caracterizava por degeneração neurológica e deformidades físicas, que em muitos casos levaram à perda de consciência e morte. Estima-se que entre 900 e 2 mil pessoas morreram na ocasião, sem contar as sequelas permanentes deixadas em outras milhares.

Somente após uma década do surgimento dos primeiros casos, a origem da Síndrome de Minamata foi esclarecida. A população local, que dependia muito da pesca e do consumo de frutos-do-mar como fonte de alimento, havia consumido peixes pescados na Baía de Minamata, onde uma empresa de produção de PVC, que usava mercúrio na fabricação, descartava os resíduos do processo.


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A tragédia de Minamata é considerada um dos maiores desastres ambientais do planeta. O caso despertou grande indignação e protestos e teve um impacto significativo na conscientização ambiental e na regulamentação industrial no Japão e em todo o mundo, levando ao fortalecimento das leis ambientais no país e à implementação de medidas mais rigorosas para controlar a poluição industrial.

Richard Dysart, Talia Shire e Robert Foxworth como Bethel, Maggie e Rob no filme 'A Semente do Diabo', de John Frankenheimer
Richard Dysart, Talia Shire e Robert Foxworth como Bethel, Maggie e Rob no filme 'A Semente do Diabo', de John Frankenheimer


Essa tragédia parece ter influenciado fortemente o roteirista David Seltzer (A Inocência do Primeiro Amor) quando escreveu A Semente do Diabo. O filme de terror dirigido por John Frankenheimer (Operação França II) ecoa as preocupações, movimentos políticos, ambiguidades e incertezas do final da década de 1970, ao mesmo tempo em que nos conduz a uma jornada intensa através do medo e da escuridão interior.


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Robert Foxworth (Aeroporto 77) interpreta Robert Verne, um médico de Washington DC comprometido com questões sociais e ecológicas, designado para apresentar um relatório para a Agência de Proteção Ambiental sobre o impacto causado por uma fábrica de papel em uma área florestal no Maine. Rob viaja para o local na companhia da esposa, a violoncelista profissional Maggie (Talia Shire de Rocky: Um Lutador), e não demora para perceber que a situação é muito mais complexa do que imaginava.

Talia Shire como Maggie no filme 'A Semente do Diabo', de John Frankenheimer
Talia Shire como Maggie no filme 'A Semente do Diabo', de John Frankenheimer


Vários lenhadores desapareceram na floresta. O responsável pela fábrica de papel, Bethel Isley (Richard Dysart, de O Enigma de Outro Mundo) garante que a população indígena está por trás dos desaparecimentos. Estes, por sua vez, culpam a poluição da fábrica por seu povo estar sofrendo de uma série de problemas de saúde, e pelo número suspeitosamente alto de seus filhos nascendo com deformidades.

A primeira hora de A Semente do Diabo diz respeito principalmente às questões ambientais, mas o ritmo do filme é surpreendentemente agradável. A tensão começa bem cedo, com um conflito entre lenhadores e um grupo de indígenas que por pouco não termina em tragédia. Mesmo quando o filme assume um tom de calmaria, as descobertas feitas durante uma visita a uma aldeia e à própria fábrica de papel garantem situações interessantes que impulsionam a história.

Imagem do filme 'A Semente do Diabo', de John Frankenheimer
Imagem do filme 'A Semente do Diabo', de John Frankenheimer


O elenco transmite bem as emoções complexas e os dilemas morais enfrentados pelos personagens. Foxworth personifica perfeitamente a luta interna de Robert, enquanto Shire traz um medo silencioso, mas palpável à personagem de Maggie. A interação entre os dois cria uma dinâmica cativante. Os diálogos, por sua vez, são carregados de significado, explorando questões mais amplas sobre a relação humana com o meio ambiente e as consequências terríveis de nossa exploração irresponsável da natureza.


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Em sua metade final, A Semente do Diabo vira um baita filme de terror, com direito a muito suspense, perseguições na floresta escura, mortes sangrentas e alguns confrontos realmente empolgantes. E sim, o filme tem seu monstro, viscoso e ameaçador como manda a cartilha do cinema B. Acredito até que a criatura seria mais lembrada se o filme não tivesse sido lançado semanas após Alien - O 8º Passageiro, cujo alienígena, claro, monopolizou todas as atenções.

Imagem do filme 'A Semente do Diabo', de John Frankenheimer
Imagem do filme 'A Semente do Diabo', de John Frankenheimer


A direção de John Frankenheimer é habilidosa, capturando a claustrofobia da floresta e a opressão do ambiente. Ele utiliza ângulos de câmera impactantes e composições visuais expressivas para transmitir a sensação de medo e paranoia que permeia a narrativa. A trilha sonora acentua os momentos de tensão e surpresa, enquanto a edição habilidosa contribui para o ritmo do filme, mantendo o espectador em suspense ao longo da narrativa.

A cinematografia merece destaque, retratando impressionantemente a beleza natural da floresta e contrastando-a com a corrupção e deformação que afligem a fauna e a flora. O design de produção é meticuloso, criando cenários sinistros e desconcertantes, nos quais guaxinins raivosos e criaturas mutantes emergem das sombras, evocando tanto a repulsa quanto a compaixão. Apesar dos recursos limitados da época, os efeitos especiais práticos são eficazes, transmitindo uma sensação genuína de horror.

Se você gosta de filmes de monstros, recomendo fortemente que dê uma chance a A Semente do Diabo. A mensagem do pesadelo ambiental de Frankenheimer continua relevante até hoje, e sua criatura mutante com certeza merece ser redescoberta pelos fãs.

Nota: 7.5/10

Título Original: Prophecy.
Gênero: Terror, suspense, ficção científica.
Produção: 1979.
Lançamento: 1979.
País: Estados Unidos da América.
Duração: 1 h 42 min.
Roteiro: David Seltzer.
Direção: John Frankenheimer.
Elenco: Talia Shire, Robert Foxworth, Armand Assante, Richard Dysart, Victoria Racimo, George Clutesi, Tom McFadden, Evans Evans, Burke Byrnes, Mia Bendixsen, Johnny Timko, Everett Creach, Charles H. Gray, Lyvingston Holmes, Graham Jarvis, Jim Burk, Bob Terhune, Lon Katzman, Steve Shemayne, John A. Shemayme, Jaye Durkus, Renato Moore, Mel Waters, Roosevelt Smith, Eric Mansker, Cheri Bergen, Clifford Hutchison, Tom D. May, Kevin Peter Hall.

Ed Walter

Criador da 'Sangue Tipo B' e escritor na comunidade de filmes de terror desde 2017. Apaixonado por filmes de terror dos anos 70 e 80. Joga 'Skyrim' até hoje.

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