Uma mulher que não deseja ter filhos se submete a uma experiência com consequências perturbadoras em 'Tic-Tac: A Maternidade do Mal', filme dirigido e roteirizado por Alexis Jacknow
Arte do filme 'Tic-Tac: A Maternidade do Mal', de Alexis Jacknow. Foto: Hulu |
A gravidez tem sido tema de muitos filmes de terror, desde clássicos como O Bebê de Rosemary até produções recentes como Abandonada e O Nascimento do Mal. Agora, o assunto volta a ganhar destaque em Clock, um terror psicológico do serviço de streaming Hulu, que chega ao Brasil através do Star+ com o título engraçado de Tic-Tac: A Maternidade do Mal.
Dirigido pela estreante Alexis Jacknow, baseado em seu próprio curta-metragem, o filme apresenta Dianna Agron (Shiva Baby) como Ella Patel, uma designer de interiores que leva uma vida aparentemente perfeita. Ela tem uma carreira de sucesso, uma renda confortável e uma casa dos sonhos nos subúrbios. Além disso, tem tempo livre para fazer trabalhos voluntários e manter uma vida sexual ativa com o marido amoroso Aiden (Jay Ali, da série Demolidor), que está se preparando para se tornar médico.
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A única coisa que Ella Patel não tem é o desejo de ter filhos. Ela convive bem com isso, mas suas amigas não. Na verdade, elas ficam chocadas com a decisão de Ella e não escondem sua curiosidade em saber o que uma mulher de 38 anos faz sem uma criança. O pai viúvo da protagonista, Joseph (Saul Rubinek, de Os Imperdoáveis), também a pressiona, praticamente implorando para que mantenha viva sua linhagem familiar judaica.
Saul Rubinek, Dianna Agron e Jay Ali como Joseph, Ella e Aiden no filme 'Tic-Tac: A Maternidade do Mal', de Alexis Jacknow. Foto: Hulu |
Ella acaba cedendo à visão de que algo nela está quebrado e se inscreve secretamente em um ensaio clínico de ponta que parece ter sido inventado pelos roteiristas de Black Mirror sob a supervisão atenta de David Cronenberg. O experimento, dirigido pela assustadoramente calma Dra. Simmons (Melora Hardin, da série Lista Negra), promete torná-la mais receptiva a ter filhos por meio de um tratamento que envolve psicoterapia, drogas e um misterioso implante intrauterino.
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Se você é fã do gênero, provavelmente já sabe que em um filme de terror, tratamentos experimentais em instalações médicas remotas nunca terminam bem. E, de fato, as coisas terminam de maneira horrível em Tic-Tac: A Maternidade do Mal. Para não estragarmos as surpresas, vamos dizer apenas que Ella sai da clínica obcecada por ovos e louca por bebês, sendo que "louca" pode ser interpretado no sentido literal.
A atriz Dianna Agron como Ella no filme 'Tic-Tac: A Maternidade do Mal', de Alexis Jacknow. Foto: Hulu |
A jornada de Ella para corrigir o curso de seu relógio biológico é registrada com uma paleta de cores que vai perdendo a saturação, primeiro para enfatizar a natureza opressiva das pressões sociais, e depois para nos fazer experimentar um pouco do estado emocional da protagonista conforme o tratamento e seus efeitos colaterais avançam. Como a iluminação segue o mesmo caminho, o visual de algumas cenas ambientadas em interiores não é exatamente agradável, mas o recurso acaba rendendo um momento visualmente recompensador no último ato, tanto para Ella quanto para o espectador.
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O filme tem algumas situações que causam desconforto, com destaque para a cena que mostra Ella em um tanque de privação sensorial, e para uma alucinação envolvendo aranhas e uma mulher grávida, que deixarão o público feminino com os nervos à flor da pele. Já o público masculino provavelmente se contorcerá na cadeira ao presenciar uma cena particularmente horrível envolvendo uma descoberta do marido de Ella. Junte tudo isso a uma criatura assustadora que ocasionalmente faz visitas à protagonista, e temos ingredientes para um bom filme de terror.
Melora Hardin como Dra. Simmons no filme 'Tic-Tac: A Maternidade do Mal', de Alexis Jacknow. Foto: Hulu |
O problema é que, além de não haver um conceito de terror bem definido, esses momentos, mais perturbadores do que assustadores, são dispersos e raramente trazem consequências para os personagens. Na maior parte do tempo, esse olhar provocador sobre as pressões da gravidez caminha em ritmo arrastado, com a monotonia quebrada apenas pelo senso de humor deliberadamente perverso do primeiro ato, e por ocasionais momentos sentimentais vindos do relacionamento terno, mas repleto de culpa, entre Ella e seu pai.
Já vi muitos filmes de terror com ritmo lento se redimirem graças a finais intensos, e os recentes Carnifex e The Tank são bons exemplos disso. Infelizmente, a diretora Alexis Jacknow, que também é roteirista, parece tão empenhada em fornecer material para discussões que acaba caindo em uma armadilha da qual poucos diretores do pós-terror ou do terror social conseguem escapar: ela sacrifica o entretenimento em prol da mensagem.
Dianna Agron como Ella no filme 'Tic-Tac: A Maternidade do Mal', de Alexis Jacknow. Foto: Hulu |
A consequência dessa escolha é um terceiro ato anticlimático, aberto a interpretações, que ao invés de elevar, compromete ainda mais a experiência. Não tenha dúvidas que Tic-Tac: A Maternidade do Mal gerará discussões, e acho até que pode conquistar o público disposto a destrinchar suas camadas. Mas para uma obra anunciada como filme de terror, ele fica devendo.
Nota: 4.5/10
Título Original: Clock.
Gênero: Drama, suspense, terror.
Produção: 2023.
Lançamento: 2023.
País: Estados Unidos da América.
Duração: 1 h 31 min.
Roteiro: Alexis Jacknow.
Direção: Alexis Jacknow.
Elenco: Dianna Agron, Melora Hardin, Jay Ali, Grace Porter, Saul Rubinek, Laura Elizabeth Stuart, Stefan Sims, Nikita Patel, Rosa Gilmore, Charissa Allen, Kat Steffens.