O amor é o verdadeiro exorcista em 'O Exorcista: O Devoto', a sofrível sequência do clássico de William Friedkin dirigida por David Gordon Green
A atriz Lidya Jewett como Angela no filme 'O Exorcista: O Devoto', de David Gordon Green. Foto: © 2023 Universal Studios. All Rights Reserved. |
Então, alguém decidiu fazer uma nova trilogia de O Exorcista, o clássico de 1973 dirigido com maestria por William Friedkin. E desta vez, o responsável pela empreitada é David Gordon Green, um nome que se tornou muito presente nas conversas dos fãs de filmes de terror, embora pelos motivos errados. Green é o mesmo diretor da recente trilogia Halloween, cujo começo promissor se desvirtuou de forma atroz, a ponto de até os críticos mais ferrenhos da versão de 2007 de Rob Zombie começarem a questionar suas convicções.
Como O Exorcista: O Devoto, o primeiro filme da trilogia, também tem as inconfundíveis digitais da Blumhouse, a produtora de Halloween, não surpreende que os fãs tenham ficado cautelosos. O que provavelmente ninguém esperava é que, ao contrário dos filmes centrados no assassino de máscara branca que atormenta os incautos habitantes de Haddonfield com travessuras sangrentas durante a noite das bruxas, a nova trilogia de O Exorcista começasse mal já no primeiro filme.
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A cena de abertura nos leva para o pitoresco cenário do Haiti, onde o protagonista, um fotógrafo chamado Victor (Leslie Odom Jr., de Agulha no Palheiro Temporal), está de férias com sua esposa grávida. Após um terremoto abalar o prédio onde estão hospedados, Victor se vê forçado a escolher entre salvar sua esposa ou sua filha não nascida, mas não ambos. Esse incidente se revela como uma semente crucial para os eventos subsequentes. O roteiro retém informações, permitindo que o enigma se desvende gradualmente, enquanto flashbacks revelam os segredos do passado.
Ellen Burstyn e Leslie Odom Jr. como Chris e Victor no filme 'O Exorcista: O Devoto', de David Gordon Green. Foto: Anne Marie Fox/Universal Picture - © Universal Studios. All Rights Reserved. |
Encontramos Victor treze anos depois, administrando um próspero estúdio de fotografia em Atlanta, Geórgia, e vivendo em relativa harmonia com sua filha, ironicamente batizada de Angela (Lidya Jewett, de Mentes Sombrias). A menina deseja muito entrar em contato com o espírito da mãe, a ponto de arrastar sua amiga de escola, Katherine (a estreante em longas-metragens Olivia O'Neill), para uma sessão espírita improvisada na floresta sombria mais próxima. Esse passeio desencadeia uma série de eventos sobrenaturais que gradualmente se intensificam, sugerindo que uma força maligna pode ter se apossado do corpo das duas.
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Mesmo não sendo original — a história do desaparecimento das meninas não é mais do que uma variação do folclore das crianças trocadas, já apresentada em filmes como O Bosque Maldito e There's Something Wrong with the Children —, o primeiro ato do filme se desdobra com uma cadência deliberada e sutileza. O diretor explora bem a força do silêncio e dos espaços vazios para instigar a inquietação no público sobre a presença do mal na trama. Infelizmente, O Exorcista: O Devoto vai gradualmente perdendo seu apelo à medida que a história avança.
Lidya Jewett e Olivia O’Neill como Angela e Katherine no filme 'O Exorcista: O Devoto', de David Gordon Green. Foto: © 2023 Universal Studios. All Rights Reserved. |
Green revela uma assustadora falta de ousadia nas cenas de terror. O clima sombrio e anárquico do filme original, considerado um dos mais aterrorizantes de todos os tempos, se perde completamente, dando lugar a situações genéricas. A edição caótica prejudica as raríssimas cenas com potencial para causar desconforto. Já jump scares, o filme tem de sobra. Cenas que beiram o humor involuntário também, o que não combina muito com um produto que carrega o nome O Exorcista.
O filme sai definitivamente dos trilhos quando entra em cena Chris McNeil, a mãe da menina endemoniada do original. Ou melhor, uma variante desagradável dela, cujo comportamento não lembra absolutamente nada a personagem do filme de 1973. A atriz Ellen Burstyn dá o seu melhor, mas os diálogos não favorecem a personagem. Assim, nem posso dizer que me importei quando o roteiro a coloca para escanteio de maneira tão tosca que quase chega a rivalizar com o destino de Jennifer Hills em Deja Vu, a horrorosa sequência de 2019 do clássico A Vingança de Jennifer.
A atriz Olivia O’Neill como Katherine no filme 'O Exorcista: O Devoto', de David Gordon Green. Foto: © 2023 Universal Studios. All Rights Reserved. |
Também não me importei com os outros personagens, não por culpa do elenco, mas novamente porque os diálogos ruins quebram frequentemente a imersão e impedem que qualquer um seja levado a sério. Isso nos leva a um último ato sofrível, que mais parece uma paródia do próprio subgênero. A tosquice atinge níveis tão inacreditáveis que fiquei esperando pelo momento em que os exorcistas diversificados (sim, desta vez temos vários) dariam as mãos e cantariam uma canção feliz, no estilo daquela do episódio do He-Man que diz que "o bem vence o mal, afasta o temporal".
Julgando pelo nível da produção, este desfecho, embora por ora ausente, pode não ser um excludente no horizonte da trilogia que se avizinha.
Nota: 3/10
Título Original: The Exorcist: Believer.
Gênero: Terror.
Produção: 2023.
Lançamento: 2023.
País: Estados Unidos da América.
Duração: 1 h 51 min.
Roteiro: Peter Sattler, David Gordon Green, Scott Teems, Danny McBride.
Direção: David Gordon Green.
Elenco: Leslie Odom Jr., Lidya Jewett, Olivia O’Neill, Jennifer Nettles, Norbert Leo Butz, Ann Dowd, Ellen Burstyn, Okwui Okpokwasili, Raphael Sbarge, Danny McCarthy, E. J. Bonilla, Tracey Graves, Lize Johnston, Linda Blair.