O terror emerge das águas e muda Hollywood para sempre nesse clássico absoluto dirigido por Steven Spielberg
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Brody (Roy Scheider) fica cara a cara com o perigo no filme 'Tubarão'. Foto: © 1975 Universal |
Uma jovem entra nas águas de uma praia sob a luz do luar e, pouco tempo depois, é atacada por um tubarão. Você provavelmente já viu essa cena muitas vezes, já que a maioria dos filmes de tubarões recentes começa exatamente assim. Mas na década de 70, isso era novidade, e o público que a viu pela primeira vez não imaginava que estava prestes a testemunhar o nascimento de um dos maiores clássicos do cinema de horror e suspense.
Lançado em 1975, Tubarão foi um divisor de águas. Dirigido por um jovem Steven Spielberg em sua estreia em grandes produções, o filme redefiniu o conceito de blockbuster, introduziu uma nova linguagem para o terror moderno e provou que o medo mais visceral pode nascer daquilo que não se vê, mas se sente.
Baseado no romance de Peter Benchley, Tubarão transformou o medo primitivo dos oceanos em um espetáculo de tensão, susto e inteligência narrativa. Com atuações memoráveis, ritmo preciso e um uso criativo (e acidental) da ausência do monstro, o filme permanece até hoje como uma das obras mais influentes da história do cinema.
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Susan Backlinie interpreta a turista Chrissie no filme 'Tubarão'. Foto: © 1975 Universal |
O clássico de Spielberg nos leva para as praias da fictícia ilha de Amity, no litoral dos Estados Unidos. O desaparecimento da jovem Chrissie (Susan Backlinie) e o encontro do que restou de seu corpo nas areias chocam as autoridades locais. O xerife Martin Brody (Roy Scheider) tenta interditar as praias, mas enfrenta resistência do prefeito (Murray Hamilton), que teme o impacto econômico sobre a temporada de verão.
Quando novos ataques ocorrem e fica claro que há algo devorando os banhistas de Amity, Brody une forças com o oceanógrafo Matt Hooper (Richard Dreyfuss) e com o caçador de tubarões Quint (Robert Shaw), embarcando em uma jornada perigosa e claustrofóbica para caçar a criatura — um tubarão colossal, quase mitológico, que parece ter saído do próprio inconsciente coletivo.
O filme divide-se, de forma muito clara, em dois atos: o primeiro, mais urbano e político, mostra o conflito entre ciência, ganância e segurança pública. O segundo, mais físico e existencial, acompanha a caça no mar aberto, onde os homens se tornam presas e a criatura representa o caos primitivo que desafia a civilização.
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Brody e seus companheiros percebem que precisarão de um barco maior em 'Tubarão'. Foto: © 1975 Universal |
Roy Scheider oferece uma atuação contida e eficaz como o xerife Brody, um homem deslocado, vindo da cidade para a pequena ilha, que encarna o senso de dever e impotência diante do sistema. Richard Dreyfuss injeta leveza e humor ao cientista Hooper, equilibrando ceticismo e empolgação juvenil.
Robert Shaw domina a tela com intensidade e carisma, em especial na icônica cena do relato do USS Indianápolis, em que seu monólogo silencioso e sombrio transforma um simples diálogo em um momento de horror psicológico. A química entre os três é palpável. Suas diferenças e tensões criam um microcosmo de arquétipos masculinos em confronto com algo que os ultrapassa: o medo da morte, do desconhecido e do fracasso.
Spielberg constrói tensão de forma primorosa. Forçado pelos problemas técnicos do tubarão mecânico (que vivia quebrando durante as filmagens), o diretor optou por sugerir o monstro, em vez de mostrá-lo diretamente. O que parecia uma limitação se converteu em virtude: o uso da câmera subjetiva (colocando o espectador na pele do tubarão), combinado à trilha sonora ameaçadora de John Williams, cria um clima de pavor crescente.
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Brody (Roy Scheider) percebe que a praia está estranhamente vermelha em 'Tubarão'. Foto: © 1975 Universal |
O ritmo do filme é exemplar: começa com um susto violento e desacelera apenas para construir personagens e tensões sociais, antes de engatar novamente em uma segunda metade repleta de ação, claustrofobia e simbolismo. A trilha sonora composta por John Williams é talvez a mais reconhecível da história do cinema. Duas notas, repetidas com variações de velocidade e intensidade, se tornam uma entidade por si só, uma ameaça invisível.
A fotografia de Bill Butler valoriza as cores frias e o contraste entre a beleza do verão litorâneo e o horror invisível nas profundezas. A montagem de Verna Fields é vital para o ritmo preciso da narrativa. Esses acertos combinados garantiram que Tubarão não apenas revolucionasse o gênero de terror e suspense, mas também abrisse as portas para uma nova era no cinema. Spielberg demonstrou que um filme de gênero poderia ter inteligência, personagens complexos, técnica refinada e apelo comercial massivo.
A influência de Tubarão é perceptível em incontáveis obras posteriores, de Alien, o Oitavo Passageiro (com sua criatura que aparece pouco) até Jurassic Park, do próprio Spielberg, que repete a fórmula do terror à espreita com efeitos visuais mais avançados. Filmes de tubarão jamais escaparam da sombra do blockbuster de Spielberg, sempre tentando, sem igualar, seu equilíbrio entre espetáculo e sutileza.
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Richard Dreyfuss e Roy Scheider interpretam Hooper e Brody no filme 'Tubarão'. Foto: © 1975 Universal |
Além de ser um baita filme de monstro, Tubarão aborda o medo arquetípico do desconhecido, o preço da ganância e a luta humana contra forças incontroláveis. E, mesmo passadas quase cinco décadas, ele continua provocando o mesmo arrepio quando alguém entra no mar e ouve, mentalmente, aquelas duas notas ameaçadoras...
Nota: 10/10
Título Original: Jaws.
Título Nacional: Tubarão.
Gênero: Terror, suspense, aventura.
Produção: 1975.
Lançamento: 1975.
País: Estados Unidos da América.
Duração: 2 h 4 min.
Roteiro: Peter Benchley, Carl Gottlieb.
Direção: Steven Spielberg.
Elenco: Roy Scheider, Robert Shaw, Richard Dreyfuss, Lorraine Gary, Murray Hamilton, Carl Gottlieb, Jeffrey Kramer, Susan Backlinie, Jonathan Filley, Ted Grossman, Chris Rebello.
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