Retro Review | O Lago dos Zumbis (Le lac des morts vivants, 1981)

Mortos-vivos aquáticos aterrorizam vilarejo europeu em 'O Lago dos Zumbis', filme de terror roteirizado por Jesús Franco e dirigido por Jean Rollin


Antonio Mayans e Pascale Vital no filme 'O Lago dos Zumbis', de Jean Rollin
Antonio Mayans e Pascale Vital no filme 'O Lago dos Zumbis', de Jean Rollin


Co-produção entre França e Espanha através da Eurociné, O Lago dos Zumbis é um filme de terror sobre moradores de um vilarejo europeu na década de 1970, ameaçados por mortos-vivos verdes que se escondem em um lago. O longa-metragem tem roteiro do pai do filme B espanhol, Jesús Franco. Ele inclusive iria dirigir, mas foi substituído pelo francês Jean Rollin, realizador de obras como A Rosa de Ferro (1973), Les démoniaques (1974) e Lábios de Sangue (1974).

Mesmo com a mudança, assim como a sombra de Spielberg pairou sobre Tobe Hooper em Poltergeist: O Fenômeno, a de Jesús Franco parece presente em muitos momentos de O Lago dos Zumbis. Começando pela cena de abertura, onde a atriz Pascale Vital (Na Pele de um Tira), se livra de suas peças de roupas e se prepara para um relaxante mergulho no lago. A maneira voyeurística como a câmera registra cada movimento do corpo uniformemente bronzeado da atriz, dentro e fora d'água, carrega o DNA inconfundível de Franco.

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As digitais do cineasta espanhol por trás de Ela Matou em Êxtase (1971) e A Virgem e os Mortos (1973) ficam ainda mais nítidas quando um time inteiro de jogadoras de vôlei pára sua van perto do rio e dá início a uma das cenas de nudez mais descaradamente gratuitas que eu me lembro de ter visto em um filme de terror. A título de curiosidade, várias cenas foram refeitas com as atrizes vestindo roupas, e estão incluídas como extras no DVD "EuroShock Collection", da Image Entertainment.

Imagem do filme 'O Lago dos Zumbis', de Jean Rollin


Independente de ser naturalista ou não, o destino de quem entra no lago é um só: ser atacado por um morto-vivo aquático ou, no caso das moças do vôlei, por vários. A maquiagem da primeira criatura é uma tosqueira só — basicamente, um ator com um dos olhos coberto por algo que eu não faço ideia do que seja, e o rosto coberto por tinta verde que derrete conforme ele se move na água. Os outros monstros têm uma maquiagem ligeiramente melhor. Menos aquele morto-vivo bonzinho de olhos esbugalhados interpretado por Pierre-Marie Escourrou (Os Heróis Nunca Morrem), que é apenas um cara com o rosto verde e uma cicatriz na testa.

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Notem que escrevo morto-vivo pois, ao contrário do que sugere o título nacional e até alguns diálogos do filme, as criaturas apresentadas em O Lago dos Zumbis têm uma ligação forte com o folclore do vampiro. Isso fica claro quando uma delas decide sair do lago para se aventurar na cidade e, ao encontrar uma vítima, morde seu pescoço e bebe seu sangue, ao invés de devorar sua carne, como costuma acontecer nos filmes desse subgênero. Essa confusão entre vampiro e zumbi pode ser notada em outros filmes antigos, como A Noite do Terror Cego (1972) e Cemitério Maldito (1989), e mais recentemente na série de terror da Netflix, Kingdom.

A atriz Nadine Pascal no filme 'O Lago dos Zumbis', de Jean Rollin
A atriz Nadine Pascal no filme 'O Lago dos Zumbis', de Jean Rollin


Falando em A Noite do Terror Cego, a tosqueira de Jean Rollin tem outras similaridades com a Quadrilogia dos Mortos-Vivos Cegos, de Amando de Osorio. A principal delas é que as vítimas ficam paradas, esperando os mortos se aproximarem. O ataque se resume à mordida no pescoço, que mais parece uma carícia, e alguns pingos de sangue aguado. É uma abordagem morna, principalmente quando consideramos que o filme foi feito em uma época marcada pelo gore hardcore de Zombie Holocausto, de Marino Girolami, e pelos splatters de Lucio Fulci.

A morte da segunda mulher é seguida por uma cena bizarra, com uma procissão de moradores do vilarejo carregando seu corpo pela cidade e o depositando na frente da casa do prefeito, porque... bem, eu não sei. O que sei é que a reação do ator que interpreta o pai da vítima é tão sem emoção que chega a ser hilária. Mas ele não é o único personagem com expressão de madeira em O Lago dos Zumbis. Praticamente todos, à exceção talvez do prefeito interpretado por Howard Vernon (O Silêncio do Mar) entregam performances medonhas. Acredito até que, se não fosse pela maquiagem verde, seria difícil dizer quem é humano e quem é morto-vivo no filme.

Pierre-Marie Escourrou e Anouchka no filme 'O Lago dos Zumbis', de Jean Rollin
Pierre-Marie Escourrou e Anouchka no filme 'O Lago dos Zumbis', de Jean Rollin


Outros momentos involuntariamente cômicos surgem a seguir, enquanto o diretor alterna entre uma variedade de gêneros e subgêneros cinematográficos, do exploitation ao filme da Segunda Guerra Mundial, do horror sangrento até o melodrama familiar. Há uma briga de faca terrivelmente mal-filmada entre dois mortos-vivos. Em algumas cenas aquáticas no lago, dá para ver partes de uma piscina. Isso sem contar os erros de continuidade grotescos, que incluem roupas que reaparecem após uma personagem ficar nua, e sapatos que voam para longe quando uma vítima é atacada, e magicamente retornam para o pé na cena seguinte.

Um filme com tantos erros não teria dificuldades para atingir o status de tão ruim que é bom, mas eu realmente acho que O Lago dos Zumbis não chega a tanto. O ritmo lento e a dificuldade do diretor em estabelecer um tom consistente atrapalha demais a experiência. A ausência de um protagonista, também. O prefeito é o que mais se aproxima desse papel, mas o personagem serve mais para revelar detalhes sobre o passado do vilarejo, e para organizar a resistência contra os mortos que, diga-se de passagem, ocasionalmente tropeçam e quase caem ao tentar sair do lago.

Imagem do filme 'O Lago dos Zumbis', de Jean Rollin
Imagem do filme 'O Lago dos Zumbis', de Jean Rollin


O Lago dos Zumbis é considerado por muitos críticos e fãs como uma cópia inferior de Horror em Alto Mar (1977), de Ken Wiederhorn, sobre os visitantes de uma ilha remota atacados por soldados mortos-vivos. Também é considerado um dos piores filmes de zumbis já feitos, e aparece com frequência em listas dos maiores erros desse subgênero. Durante anos, Rollin negou ter dirigido o filme sob o pseudônimo de JA Lazer. Mais tarde ele admitiu ser (ir)responsável pela obra, mas também revelou que se arrependeu profundamente de ter aceitado dirigir.

Acredito que O Lago dos Zumbis seria melhor se o roteiro fosse retrabalhado para dar mais sentido à história sem pé nem cabeça da menina Helena (Anouchka, de Mondo cannibale) e de seu pai morto-vivo que passou uma década no fundo do lago mas continua com o cabelo estranhamente bem repartido. Ou se o diretor apenas deixasse o melodrama tosco de lado e se concentrasse na tosqueira divertida, providenciando mais moradores para serem perseguidos pelos mortos. E mais times de vôlei feminino para nadar no lago.

Nota: 3/10

Título Original: Le lac des morts vivants.
Gênero: Terror.
Produção: 1981.
Lançamento: 1981.
País: França, Espanha.
Duração: 1 h 30 min.
História: Julián Esteban.
Roteiro: Jesús Franco.
Direção: Jean Rollin, Julian de Laserna (não creditado)
Elenco: Howard Vernon, Pierre-Marie Escourrou, Anouchka, Antonio Mayans, Nadine Pascal, Youri Radionow, Bertrand Altmann, Gilda Arancio, Marcia Sharif, Yvonne Dany, Jean-René Bleu, Jean Rollin, Edmond Besnard, Pascale Vital.

Ed Walter

Criador da 'Sangue Tipo B' e escritor na comunidade de filmes de terror desde 2017. Apaixonado por filmes de terror dos anos 70 e 80. Joga 'Skyrim' até hoje.

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