Crítica | Drácula: A Última Viagem do Demeter (The Last Voyage of the Demeter, 2023)

Javier Botet interpreta o rei dos vampiros em 'Drácula: A Última Viagem do Demeter', adaptação de um capítulo do romance de Bram Stoker dirigida por André Øvredal


Martin Furulund e Javier Botet como Larsen e Drácula no filme 'Drácula: A Última Viagem do Demeter', de André Øvredal
Martin Furulund e Javier Botet como Larsen e Drácula no filme 'Drácula: A Última Viagem do Demeter', de André Øvredal


Em 6 de julho de 1897, o navio cargueiro Demeter deixou o porto de Varna, transportando algodão turco, barris de petróleo e caixas de madeira particulares endereçadas a Londres. Quatro semanas depois, a embarcação foi avistada nas rochas de Whitby Harbour, parcialmente destruída e sem nenhum tripulante a bordo. Se você leu o romance gótico de terror do autor irlandês Bram Stoker, já sabe que a causa da tragédia no Demeter foi um vampiro. Não um vampiro qualquer, mas o próprio Conde Drácula, que pegou carona no navio porque planejava expandir seu reinado de terror para além das fronteiras da Transilvânia.

Caso você não tenha lido o clássico da literatura ou nunca tenha assistido a um filme de Drácula, fique tranquilo, porque o diretor e roteirista norueguês André Øvredal, o mesmo realizador do arrepiante A Autópsia, assumiu a responsabilidade de levar esse capítulo para as telas em Drácula: A Última Viagem do Demeter. Considerando que o capítulo dedicado ao 'Diário do Capitão' no romance Drácula é curto e deixa muita coisa a cargo da imaginação do leitor, Øvredal e seus co-roteiristas têm bastante liberdade para inventar situações que enriqueçam a história. Eles até que fazem isso, embora nem todas as novas ideias funcionam a favor do filme.


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David Dastmalchian (Oppenheimer) interpreta Wojchek, o primeiro imediato do malfadado Demeter, que está precisando de um novo marinheiro para carregar uma carga entregue por ciganos mal-humorados no porto de Varna. Quando o homem escolhido para o trabalho se demite alegando que o símbolo do dragão estampado nas caixas de madeira que deveria carregar é um mau presságio, Wojchek recruta Clemens (Corey Hawkins, de Kong: A Ilha da Caveira), um jovem que quer conseguir passagem para a Inglaterra.

Liam Cunningham, Chris Walley e Corey Hawkins como Eliot, Abram e Clemens no filme 'Drácula: A Última Viagem do Demeter', de André Øvredal
Liam Cunningham, Chris Walley e Corey Hawkins como Eliot, Abram e Clemens no filme 'Drácula: A Última Viagem do Demeter', de André Øvredal


Clemens rapidamente se mostra o tripulante perfeito. Além de dominar como ninguém a arte de se guiar pelas estrelas, o rapaz tem conhecimentos de medicina e pode fazer transfusões de sangue improvisadas. Se há um problema no navio, ele é o primeiro a apontar. Se há um barulho estranho em algum canto escuro, ele é o primeiro (e o único) a investigar. Clemens é tão bom em tudo o que faz que cheguei a me perguntar como os marinheiros do Demeter conseguiram sobreviver tantos anos sem ele.


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Isso gera dois problemas para Drácula: A Última Viagem do Demeter. O primeiro é que esse personagem não é tão interessante quanto os roteiristas pensam que é. O segundo é que o excesso de foco nele limita demais a participação dos outros. A maioria entra em cena apenas para discordar de Clemens, admitir que Clemens estava certo e morrer sozinho em algum canto escuro do navio. Como o roteiro também não tem tempo para desenvolver ninguém ou sequer dar-lhes um mínimo de profundidade, dificilmente alguém se importará com suas mortes.

Corey Hawkins e Aisling Franciosi como Clemens e Anna no filme 'Drácula: A Última Viagem do Demeter', de André Øvredal
Corey Hawkins e Aisling Franciosi como Clemens e Anna no filme 'Drácula: A Última Viagem do Demeter', de André Øvredal


A falta de atenção com os pobres marinheiros do Demeter atinge níveis ainda mais alarmantes quando entra em cena outra tripulante inesperada, Anna, interpretada por Aisling Franciosi (The Nightingale), que passa a disputar o protagonismo com Clemens. Para não dizer que a câmera não desgruda deles, o capitão do navio, Eliot (Liam Cunningham, da série Game of Thrones), e seu neto Toby (Woody Norman, de Toc, Toc, Toc: Ecos do Além), ganham um certo destaque. O menino inclusive está presente em algumas das cenas mais tensas do filme, e duas delas realmente me surpreenderam pela ousadia.


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Já as decisões tomadas pelos marinheiros condenados e pelos dois protagonistas forçados surpreendem mais pela ausência de lógica. Mesmo após avisados de que há uma criatura demoníaca a bordo, matando animais e causando o desaparecimento de marinheiros, a tripulação demora uma eternidade para reagir. Demoram mais tempo ainda para perceber que o monstro está escondido em uma das caixas, algo que parece óbvio desde os primeiros minutos do filme.

Javier Botet como Drácula no filme 'Drácula: A Última Viagem do Demeter', de André Øvredal
Javier Botet como Drácula no filme 'Drácula: A Última Viagem do Demeter', de André Øvredal


Quanto ao plano que os marinheiros bolam para enfrentar a criatura… bem, o que posso dizer é que é um plano muito, muito ruim. Tenho certeza de que se os roteiristas tivessem assistido a O Galeão Fantasma, cult setentista do diretor espanhol Amando de Ossorio que também trata de mortos-vivos escondidos em caixotes de madeira a bordo de um navio, eles teriam pensado em uma solução bem mais simples. E, definitivamente, muito mais eficaz.

A maneira como o vampiro interpretado por Javier Botet (Mara: O Demônio dos Sonhos) é apresentado tem seus altos e baixos. Drácula começa debilitado devido à dieta controlada de sangue humano e recupera sua energia conforme rasga pescoços pelos quatro cantos do Demeter. Seu visual parece uma mistura das criaturas de Nosferatu e de Os Vampiros de Salém, com detalhes que lembram uma das formas do vampiro em Drácula de Bram Stoker, a melhor de todas as adaptações do romance. O acabamento em CGI é horrível, mas os efeitos práticos são bem cuidados.

Corey Hawkins e Aisling Franciosi como Clemens e Anna no filme 'Drácula: A Última Viagem do Demeter', de André Øvredal
Corey Hawkins e Aisling Franciosi como Clemens e Anna no filme 'Drácula: A Última Viagem do Demeter', de André Øvredal


O navio amaldiçoado oferece um bom cenário para cenas de terror, e tanto a tempestade que não para de cair quanto a névoa quase palpável que toma conta da embarcação no ato final contribuem para estabelecer uma atmosfera assustadora. A batalha final é um pouco atropelada, mas não chega a frustrar. Já a última cena é difícil de defender. Criar personagens do nada e forçá-los como protagonistas em uma história pouco explorada no livro é uma coisa. Já sugerir que um personagem que não existe na história original pode roubar o protagonismo de figuras clássicas em uma possível sequência é outra completamente diferente, e eu realmente espero que Øvredal desista dessa ideia.

Nota: 5/10

Título Original: The Last Voyage of the Demeter.
Gênero: Terror.
Produção: 2023.
Lançamento: 2023.
País: Estados Unidos da América, Reino Unido, Malta, Itália, Alemanha.
Duração: 1 h 58 min.
Roteiro: Bragi F. Schut, Zak Olkewicz.
Direção: André Øvredal.
Elenco: Corey Hawkins, Aisling Franciosi, Liam Cunningham, David Dastmalchian, Chris Walley, Jon Jon Briones, Stefan Kapicic, Martin Furulund, Nikolai Nikolaeff, Woody Norman, Javier Botet, Graham Turner, Andy Murray, Nicolo Pasetti, Christopher York, Vladimir Cabak, Rudolf Danielewicz, Noureddine Farihi, Malcolm Galea, Adam Shaw, Jack Doggart, Joe Depasquale, Sally Reeve.

Ed Walter

Criador da 'Sangue Tipo B' e escritor na comunidade de filmes de terror desde 2017. Apaixonado por filmes de terror dos anos 70 e 80. Joga 'Skyrim' até hoje.

1 Comentários

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  1. Tava ta expectativa mas esse filme é sonolento...foi difícil terminar! Se tivesse uns 30 minutos a menos seria um pouco melhor

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