Remake reverso | E se os filmes de terror modernos fossem refilmados nos anos 70?

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Que tal um remake reverso de 'Não! Não Olhe!', dirigido por Stuart Gordon?


Antes de o terror virar metáfora sobre o trauma, ele era só isso mesmo: trauma. Sangue, gritos, nudez, cigarro e close em rostos suados. Nos anos 70, o horror tinha textura de película gasta, cheiro de gasolina e uma trilha sonora que parecia saída de uma boate abandonada.

As coisas mudaram bastante com o passar dos anos, principalmente após o movimento que alguns críticos chamam de pós-terror e outros de terror elevado. Mas... e se esses filmes modernos, elegantes, minimalistas e cheios de significado, tivessem sido feitos naquela década em que tudo era mais bruto, mais sujo e, de alguma forma, mais vivo? Imaginamos esse cenário, e o resultado pode ser conferido abaixo.



Midsommar: O Mal Não Espera a Noite (Midsommar, 2019)

Florence Pugh como Dani no filme 'Midsommar: O Mal Não Espera a Noite'
Midsommar: O Mal Não Espera a Noite. Foto: © A24


O original:

Dirigido por Ari Aster, Midsommar é uma tragédia ensolarada sobre luto, manipulação e codependência emocional, ambientada em uma comunidade sueca onde o terror acontece à luz do dia. Tudo é simbólico, elegante e muito bem comportado. Até os sacrifícios humanos parecem ter direção de arte.


O remake:

Midsommar: O Massacre (Midsommar: Blood Bath, 1974)

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Um remake reverso de 'Midsommar' precisa de uma final girl, assassinos (não muito) mascarados e, é claro, um urso


Nas mãos de Wes Craven, Midsommar vira um slasher pagão com gosto de fita VHS mofada e gritos ecoando no campo.

Jamie Lee Curtis interpreta Dani, uma estudante americana que viaja com o namorado idiota e um grupo de amigos para um festival folclórico sueco que promete amor, flores e cerveja barata. Ao invés disso, encontram assassinos encapuzados que começam a eliminá-los de maneiras sangrentas. Tudo isso para chegar à sobrevivente final, que será oferecida como sacrifício para um... urso.

O filme tem fotografia quente e granulada, e a comunidade sueca parece uma mistura entre O Massacre da Serra Elétrica e O Homem de Palha. Os moradores sorriem demais, as danças duram tempo demais, e quando alguém se afasta para urinar, nunca mais volta.

Os assassinatos começam discretos — um corpo pendurado em um espantalho, uma cabeça dentro de uma colmeia — até explodirem em sangue e caos. O clímax mostra Dani enfrentando o líder do culto com uma foice e gritando: “Vocês não me amam, vocês me usaram!”, antes de incendiar tudo.

Craven finaliza com uma panorâmica da floresta em chamas e um sorriso congelado de Dani no meio das flores, trilha de sintetizador e créditos vermelhos sobre o fogo. O subtexto emocional se foi, mas o público adolescente aplaude de pé.


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Hereditário (Hereditary, 2018)

Toni Collette como Annie no filme 'Hereditário'
Hereditário. Foto: © A24


O original:

Depois que a matriarca da família morre, uma família enlutada é assombrada por acontecimentos trágicos e perturbadores, e começa a desvendar segredos obscuros. Ari Aster transformou o drama familiar em uma ópera trágica sobre herança maldita e luto. Hereditário é um filme meticuloso, controlado, onde o terror surge do silêncio e da perda.


O remake:

Uma Noite de Horrores na Casa Infernal (Hereditary: The Evil Grandma from Hell, 1979)

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Uma vovó possuída carregando uma motossera? Bem-vindos do remake reverso de 'Hereditário'


Filmando com orçamento de garagem e muita coragem, o diretor estreante Sam Raimi transforma Hereditário em um festival de sangue ambientado numa casa cheia de bonecos e portas rangendo.

Bruce Campbell é Peter, um adolescente que começa a perceber que sua família está amaldiçoada; Ellen Sandweiss é sua mãe, uma escultora obcecada por criar miniaturas de cenas macabras. Quando o corpo da avó retorna dos mortos possuído por demônios, as coisas descambam rápido: livros voam, braços decepados surgem do porão, árvores mal-intencionadas se aproximam da casa, e a cabeça da irmã gira 360 graus antes de ser arremessada pela janela.

A câmera gira junto, literalmente: Raimi filma tudo com energia maníaca — dutch angles, corridas de câmera pela casa e litros de sangue jorrando das rachaduras das paredes.

O ritual satânico do final vira um caos gore com stop motion: demônios feitos de massa de modelar dançam ao redor do corpo de Peter, que levita com o rosto coberto de gosma verde. No último plano, Raimi entrega seu toque de humor: o boneco da avó pisca para a câmera.

O público de drive-in vai à loucura; os críticos chamam de “violento demais para ser levado a sério”. Stephen King diz que "esse é o filme mais assustador já feito". Mas o longa acaba sendo proibido em todos os países, provavelmente por causa da cena das árvores.



O Homem Invisível (The Invisible Man, 2020)

Elisabeth Moss como Cecilia no filme 'O Homem Invisível'
O Homem Invisível. Foto: © 2020 Universal Pictures


O original 

Dirigido por Leigh Whannell, O Homem Invisível reimagina o clássico de H.G. Wells como um thriller psicológico moderno sobre abuso e controle. Elisabeth Moss interpreta Cecilia, uma mulher que acredita estar sendo perseguida pelo ex-namorado — mesmo após a morte dele.


O remake:

Pavor Invisível (L'esorcista 2, 1974)

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Maldito Homem Invisível! Como ousa cortar a água quente do chuveiro?


Nas mãos de Lucio Fulci, O Homem Invisível se torna um pesadelo de corpos em decomposição, zooms desnecessários e close-ups de olhos esbugalhados.

A trama, ambientada numa mansão costeira na Itália, acompanha Paola (Rosalba Neri), uma mulher traumatizada pelo marido cientista (Klaus Kinski, naturalmente enlouquecido). Após a misteriosa morte do marido (supostamente devorado por um tubarão), fenômenos bizarros começam a ocorrer: portas se abrem sozinhas, objetos flutuam, e os criados aparecem sem olhos. Literalmente, alguém os removeu.

Fulci transforma a invisibilidade em um festival de mutilações gotejantes e erotismo doentio. Há uma sequência icônica em que a protagonista toma banho enquanto o homem invisível liga o rádio e corta a água quente, culminando em um close grotesco de uma navalha flutuante descendo em câmera lenta enquanto a pele de Paola se arrepia de medo. Ou talvez devido à água gelada do chuveiro.

O terceiro ato abandona qualquer senso narrativo: a mansão vaza sangue, o chão da casa derrete, e o marido invisível reaparece com o rosto parcialmente dissolvido. O filme termina com Paola gritando para a câmera enquanto Fulci aproxima o zoom até penetrar o globo ocular dela.

A título de curiosidade, o filme foi lançado na Itália como uma sequência falsa de O Exorcista. Em VHS, ganhou o título alternativo de O Homem Que Via o Inferno (L’Uomo Che Vedeva l’Inferno).


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A Bruxa (The VVitch: A New-England Folktale, 2015)

Anya Taylor-Joy como Thomasin no filme 'A Bruxa'
A Bruxa. Foto: © A24


O original

Dirigido por Robert Eggers, A Bruxa é um estudo austero sobre fé, paranoia e isolamento. Ambientado na Nova Inglaterra de 1630, o filme acompanha uma família puritana que é expulsa da comunidade e passa a viver à beira de uma floresta sinistra, onde tudo — do sumiço de um bebê à decadência moral do pai — parece obra do diabo. É o terror do silêncio, do fanatismo e da culpa cristã.


O remake

A Bruxa: Sob o Domínio da Vingança (Kill the Witch, 1975)

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A bruxa está prestes a descobrir que mexeu com o homem errado


Nas mãos de Sam Peckinpah, A Bruxa perde a meditação religiosa e ganha pólvora, suor e vingança. 

Charles Bronson interpreta William, um ex-soldado que mata uma gangue inteira de assaltantes e vai viver com a esposa (Sondra Locke) e os filhos em uma cabana isolada. Quando sua filha adolescente é raptada por um grupo de adoradores do demônio liderados por uma bruxa que vive nas colinas, ele decide fazer justiça com as próprias mãos.

Peckinpah filma a floresta como um campo de guerra, com closes em olhos cansados e sangue espirrando em câmera lenta. William é um homem ferido, lutando contra o próprio passado e contra algo que ele não entende — talvez o diabo, talvez ele mesmo. Entre tiros, preces e delírios alcoólicos, o filme se torna um thriller de vingança sobrenatural, com simbolismo acidental e muito barulho de espingarda.

A trilha de Jerry Fielding mistura banjos e corais infernais; a fotografia é quente, seca, quase desértica. No clímax, Bronson elimina toda a seita e encara a bruxa — uma mulher nua coberta de cinzas — antes de atirar três vezes. O filme termina com um plano aberto do fogo consumindo tudo.

Os críticos chamam de “blasfemo”, o público chama de “catártico”. Peckinpah chama de “terça-feira”.


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O Farol (The Lighthouse, 2019)

Imagem do filme 'O Farol'
O Farol. Foto: © A24


O original:

Robert Eggers transformou a solidão em pesadelo. O Farol acompanha dois guardiões, interpretados por Willem Dafoe e Robert Pattinson, presos em uma ilha isolada, enquanto a loucura os consome sob o som incessante da neblina e do mar. É um conto sobre poder, repressão e insanidade, filmado em um preto e branco hipnótico e sufocante.


O remake

O Farol do Desejo (El Faro del Deseo, 1973)

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Cuidar da manutenção de um farol em uma ilha deserta não é trabalho para homens


Jesús Franco, o mestre do erotismo delirante, reimagina O Farol como um pesadelo gótico e sensual, com título alternativo em alguns países: Os Delírios Eróticos de Marina, com cenas extras de sexo, e Duas Virgens no Farol dos Homen-Peixe, com cenas extras de terror que mostram as protagonistas sendo perseguidas por mutantes aquáticos. Elas foram filmadas por Jean Rollin, embora ele alegue não ter envolvimento com isso.

Christina von Blanc interpreta Marina, uma jovem ingênua enviada para cuidar de um farol remoto após a misteriosa morte do antigo zelador. Soledad Miranda é Lía, uma mulher enigmática que vive na ilha e diz ser o espírito guardião do mar.

A atmosfera é febril desde o primeiro minuto: brumas artificiais, ruídos distorcidos de gaivotas e zooms indecentes. A relação entre as duas mulheres oscila entre fascínio e repulsa. Franco filma tudo com seu olhar voyeurista e hipnótico, onde cada cena parece um sonho erótico interrompido por um grito.

O farol em si vira um símbolo fálico óbvio, piscando em ritmo com a trilha de órgão barroco e gemidos distantes. Há danças à luz da lamparina, rituais de purificação em marés noturnas e flashbacks confusos de uma tempestade que talvez nunca tenha acontecido.

No terceiro ato, Marina descobre o diário do antigo zelador, descrevendo “a mulher que veio do mar para levá-los à loucura”. O filme termina com as duas mulheres desaparecendo nuas na espuma, enquanto a luz do farol pisca uma última vez, agora avermelhada.

Os críticos chamam de “pornografia marítima existencial”; Franco chama de “poesia visual”. O público europeu? Lotou as sessões de meia-noite.



Corrente do Mal (It Follows, 2014)

Maika Monroe como Jay no filme 'Corrente do Mal'
Corrente do Mal. Foto: © 2014 - RADiUS/TWC


O original 

Dirigido por David Robert Mitchell, Corrente do Mal é um terror atmosférico sobre o medo da intimidade e da mortalidade. Após uma relação sexual, uma jovem passa a ser perseguida por uma entidade que pode assumir qualquer forma humana, e que nunca para de andar. Minimalista, simbólico e melancólico, tornou-se um dos filmes mais influentes do terror moderno.


O remake

Siga-me (Follow Me, 1979)

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Um remake reverso de 'Corrente do Mal'? Só se for dirigido por Brian de Palma


Brian De Palma transforma It Follows em Follow Me, um thriller paranoico com mais espelhos, voyeurismo e zooms do que seria clinicamente recomendável. Margot Kidder é Jay, uma estudante sensual e atormentada que acredita estar sendo seguida por figuras misteriosas após um encontro amoroso. John Travolta, ainda no auge da jaqueta de couro, é o namorado duvidoso que jura não ter nada a ver com isso.

De Palma filma tudo como um delírio sensual e esquizofrênico: longas tomadas de câmera circular, corpos suados refletidos em vitrines e uma trilha de sintetizador pulsante que soa como um coração em pânico. A entidade que segue Jay nunca é mostrada diretamente — apenas silhuetas, reflexos, sombras nos corredores e closes de rostos deformados por lentes anamórficas.

O subtexto sexual vira texto explícito. Jay passa boa parte do filme dividida entre desejo e medo, questionando se a perseguição é real ou apenas culpa católica pós-sexo. Há uma sequência memorável em que ela tenta escapar de um cinema pornô, e todas as pessoas na sala começam a virar a cabeça lentamente em sua direção, acompanhadas por um split diopter shot impecável.

O final é uma explosão de paranoia cromática: Jay se tranca num quarto espelhado e enfrenta dezenas de reflexos do perseguidor, até que uma bala disparada em slow motion quebra o vidro e o filme corta para o rosto dela, exausta, rindo.

A trilha de Pino Donaggio toca uma última nota, e a câmera se afasta em uma grua, revelando outra figura andando em sua direção.

De Palma chama a obra de “um romance sobre a culpa”. Os críticos, de “pornografia hitchcockiana”.



Corra! (Get Out, 2017)

Daniel Kaluuya como Chris no filme 'Corra!'
Corra! - Foto: © 2016 Universal Pictures


O original 

No longa de estreia de Jordan Peele, um jovem fotógrafo negro visita a família da namorada branca e descobre alguns segredos perturbadores. Um thriller de horror social afiado e satírico, que mistura crítica racial, paranoia e humor ácido.


O remake

Saia! (Vieni Fuori!, 1976)

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'Vieni Fuori!', ou que aconteceria se Dario Argento dirigisse 'Corra!'...


Dario Argento transforma Get Out em Vieni Fuori!, uma fábula psicodélica e violentamente colorida sobre identidade e fascinação racial. Paul Winfield é Chris, um fotógrafo norte-americano que viaja à Itália para conhecer a família aristocrática da namorada (Stefania Casini). A mansão é uma explosão de cores, cortinas e espelhos, e todos os empregados parecem saber algo que ele não sabe.

Argento substitui o comentário social direto por simbolismo operístico e paranoia estética. A câmera se move como um espírito: segue Chris pelos corredores iluminados por lâmpadas roxas e vermelhas, enquanto murmúrios em latim ecoam ao fundo. Há sangue, muito sangue. Mas também veludo, taças de vinho e close-ups de olhos abertos demais.

No segundo ato, Chris descobre um salão subterrâneo onde corpos são preservados em tanques de vidro, esperando “novas almas”. O ritual de transferência é um balé grotesco: bisturis dançando em sincronia, luz estroboscópica e um coral gritando “Vieni fuori!” (“Saia!”) enquanto o sangue escorre como tinta.

Argento encerra com uma sequência de sonho: Chris fugindo por um bosque de néon, perseguido por sua própria sombra, enquanto o rosto da namorada se mistura ao da mãe dele num duplo negativo alucinado. A câmera gira, o som aumenta, e o filme termina com uma gargalhada que ecoa nos créditos coloridos.

Os críticos chamam de “um pesadelo racial barroco e indecifrável”; Argento chama de “um poema sobre corpos e cor”.


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O Babadook (The Babadook, 2014)

Imagem do filme 'O Babadook'
O Babadook - Foto: © 2014 - Causeway Films


Dirigido por Jennifer Kent, O Babadook é uma parábola sombria sobre depressão, maternidade e luto. Amelia, uma mãe viúva, tenta lidar com o comportamento difícil do filho enquanto uma entidade monstruosa — saída de um livro infantil — invade sua casa e sua mente. Um terror psicológico elegante, cheio de simbolismo e dor contida.


O remake

O Livro do Terror (Il Libro del Terrore, 1972)

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Arregalem bem os olhos, porque tem um monstro no quarto


Com Mario Bava no comando, O Babadook vira Il Libro del Terrore, um pesadelo gótico-pop filmado em Technicolor histérico, onde o monstro é tão elegante quanto as cortinas. Edwige Fenech interpreta Amelia, agora uma mãe glamourosa, sempre à beira de um colapso nervoso (e de um close dramático). Ivan Rassimov surge como o enigmático vizinho, que pode ser o próprio demônio, ou só um encanador muito sensual.

A fotografia alterna luzes verdes, roxas e vermelhas, transformando o quarto da criança num carnaval de pesadelos. O livro do Babadook é uma obra artesanalmente grotesca, com ilustrações que ganham vida em stop motion e risadas reverberando por fitas magnéticas. O monstro, interpretado por um ator mascarado e envolto em fumaça artificial, surge em sombras alongadas e risadas distorcidas — algo entre Nosferatu e um animador de festas macabras.

Bava, como sempre, não se preocupa muito com coerência narrativa: há espelhos que choram, brinquedos que sangram e uma sequência inteira em que Amelia é perseguida por uma sombra projetada no teto. Tudo ao som de um órgão barroco e batimentos cardíacos sintetizados.

No clímax, a protagonista enfrenta o Babadook num duelo quase operístico dentro de um quarto iluminado apenas por luz estroboscópica vermelha. Ela o derrota com um crucifixo, água benta, um grito e uma bofetada digna de telenovela italiana. O monstro se desfaz em fumaça azul, e Amelia cai de joelhos, com lágrimas borrando o rímel.

O filme termina com ela cuidando de um filhote de corvo no porão, enquanto o narrador murmura: “O amor e o medo são irmãos, e ambos dormem na mesma cama.”



Não! Não Olhe! (Nope, 2022)

Daniel Kaluuya como OJ no filme 'Não! Não Olhe!'
Não! Não Olhe! - Foto: © 2022 Universal Studios


O original:

Em Não! Não Olhe!, Jordan Peele transforma a paranoia ufológica em espetáculo cinematográfico. O filme mistura faroeste, ficção científica e crítica à obsessão humana por registrar tudo, mesmo o que pode nos matar. Dois irmãos tentam capturar em vídeo uma presença misteriosa nos céus, descobrindo que o “show” pode estar devorando o público.


O remake

Os Observadores do Além (The Watchers from Beyond, 1979)

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Oh não! Os seres tentaculares interdimensionais pararam de nos observar e resolveram nos abduzir!


Nas mãos de Stuart Gordon, Não! Não Olhe! vira Os Observadores do Além, uma mistura explosiva de sangue, tentáculos e crítica à cultura de consumo, filmada com o entusiasmo de quem acabou de descobrir o botão gore da câmera.

Jeffrey Combs interpreta um cientista desempregado que vive num trailer no deserto de Nevada, convencido de que seres interdimensionais estão espionando a humanidade através de... televisores. Sua irmã (interpretada por Barbara Crampton, em sua melhor fase “assustada e coberta de gosma”) tenta convencê-lo a procurar ajuda médica, até que o aparelho de TV começa a respirar e emitir sons de mastigação.

Gordon transforma o suspense elegante de Peele em uma orgia de efeitos práticos e sarcasmo cósmico. Os OVNIs viram grandes massas de carne translúcida flutuando no céu, animadas por um punhado de marionetistas exaustos e litros de KY Jelly. Há uma cena memorável em que um fazendeiro é sugado por um feixe de luz e devolvido em formato de gelatina — ainda tentando fumar seu cigarro.

Como em todos os clássicos de Gordon, o roteiro mistura terror e libido de maneira confusa, mas fascinante. Em certo ponto, Crampton é capturada por uma criatura tentacular que tenta “entender o conceito de amor humano”, o que resulta numa sequência entre revoltantemente viscosa e curiosamente romântica, ao som de sintetizadores que soam como gemidos de baleia.

O clímax acontece dentro de uma antena parabólica gigante que se revela viva, pulsante e, de alguma forma, apaixonada pelo personagem de Jeffrey Combs. O herói precisa explodi-la por dentro, o que ele faz com uma frase de efeito inesquecível: “Vocês olham pra nós o tempo todo! Pois agora... nós olharemos pra vocês!”

Tudo termina com a Terra parcialmente derretida, Crampton e Combs rindo histericamente, e uma mensagem em tela preta: “Coming soon: The Watchers from Beyond II – The Signal Hungers.”

Os críticos chamam o filme de “um pesadelo viscoso sobre voyeurismo cósmico”, e “o tipo de cinema que faria H.P. Lovecraft pedir uma toalha”. Gordon, por sua vez, apenas sorri e diz: “Não entendo por que chamam de ficção científica. Isso é praticamente um documentário.”


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Ed Walter

Criador da 'Sangue Tipo B' e escritor na comunidade de filmes de terror desde 2017. Apaixonado por filmes de terror dos anos 70 e 80. Joga 'Skyrim' até hoje.

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